Reforma tributária: Aprovação da emenda constitucional

Câmara dos Deputados aprovou reforma tributária. Depois de mais de 30 anos de discussões, a Câmara dos Deputados deu o primeiro passo para mudar a tributação do consumo de bens e serviços no Brasil. Conforme apresentamos em nosso relatório sobre conceitos e definições da reforma tributária, a tributação indireta de PIS/Pasep, Cofins, IPI, ICMS e ISS corresponde hoje a mais de 40% da arrecadação do setor público. Uma mudança dessa monta tende a afetar não só o equilíbrio entre setores da economia, mas também entre regiões – daí a dificuldade de se chegar a um consenso.

O modelo atual é considerado disfuncional, já que é cumulativo em grande parte (penalizando setores com maiores cadeias de produção), baseado na tributação na origem (o que onera investimentos e exportações e permite a chamada “guerra fiscal”) e com múltiplas alíquotas (o que reduz a transparência ao consumidor e aumenta a litigiosidade). A reforma tenta solucionar esses problemas, ao adotar a não-cumulatividade plena, a tributação no destino e a adoção de três alíquotas: padrão, reduzida e zero.

Mudanças na Câmara reduzem potencial da reforma. Nas negociações durante a tramitação do projeto na Câmara foram ampliados os bens e serviços que podem usufruir de tributação reduzida ou alíquota zero, com destaque para a criação de uma cesta básica nacional, e instituída a possibilidade de crédito presumido para algumas atividades. A ampliação das exceções têm o condão de reduzir o potencial da reforma, na medida em que: i) aumenta a complexidade do sistema, abrindo margem para litigiosidade; ii) reduz sua transparência ao consumidor final; e iii) amplia a alíquota padrão e as distorções alocativas, já que a perda de arrecadação tem que ser compensada pelos demais setores da economia. Por outro lado, trata-se de setores que têm apelo político, o que acabou prevalecendo nas discussões.

Mas resultado deve ser positivo. Estudos acadêmicos disponíveis mostravam que, com a proposta original da PEC nº 45/2019, o crescimento potencial do país nos 15 anos após a implementação da reforma seria ampliado entre 0,7% a 1,2% ao ano[1][2]. Setorialmente, a indústria seria a maior beneficiada da reforma, enquanto os serviços sofriam mais impactos negativos – embora isso fosse mais que compensado pelo crescimento da economia no longo prazo. Mesmo com as mudanças introduzidas no texto, o impacto deve ser positivo, embora só deva começar a ocorrer de forma direta a partir de 2027.

Artigo traz risco à fim de benefícios tributários federais. O art. 19, incluído na redação final da proposta, preserva benefícios relacionados a IPI e PIS/Cofins até o final de 2032 para as regiões Norte, Nordeste e Centro-oeste. Esses benefícios foram instituídos por lei e tinham previsão de serem encerrados ao final de 2025. A postergação dentro da proposta de reforma tributária é estranha ao texto e abre caminho para que outros benefícios sejam também postergados, o que certamente reduz o potencial da reforma e pode minar os esforços para um sistema mais simples, justo e transparente.

Depois da Câmara, Senado avaliará a matéria… Na sequência, a matéria precisará ser discutida pelo Senado, que pode fazer alterações em todo o conteúdo. A parte do texto convergente (em que não houver alteração) pode ser promulgada na sequência, enquanto os pontos divergentes devem voltar à Câmara, por meio de uma PEC paralela.

… na sequência, teremos discussão da lei complementar… ainda há necessidade de se aprovar lei complementar que detalhe os novos tributos. Questões como a definição do conceito de operações com serviços, regimes diferenciados e favorecidos, distribuição do imposto, definição de créditos para cálculo da não cumulatividade, definições acerca do Conselho Federativo, distribuição dos fundos, entre outras matérias, devem ser discutidos nessa segunda fase, que tem potencial de ser ainda mais complexa.

… e, por fim, definição das alíquotas. Somente após a definição dos diversos aspectos relegados à lei complementar é que será possível fazer o cálculo da alíquota de referência (padrão). Da experiência internacional, temos que essas costumam variar entre 15% em países em desenvolvimento a 25% em países mais desenvolvidos. Do lado negativo, ressaltamos que a ampliação do rol de exceções pode contribuir para uma alíquota mais elevada. Do lado positivo, a redução dos benefícios tributários e o incentivo à formalização da economia pela adoção da não cumulatividade plena podem ajudar a se chegar a uma alíquota menor.

A princípio, pelas declarações do próprio governo, acreditamos que a alíquota no Brasil deve ficar mais próxima a 25%. Vale ressaltar que, na proposta final, introduziu-se um artigo para assegurar que a carga tributária não será elevada. No entanto, é preciso destacar que isso depende também da referência a ser adotada.

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